segunda-feira, 17 de maio de 2010

Cobra50 Serra de São Mamede

Este ano, a nossa equipa aracnológica começou a efectuar protocolos Cobra50 (explicação do protocolo aqui) nos topos das montanhas de Portugal, de modo a que o chefe possa testar a variação da riqueza de espécies (entre outras coisas) segundo a altitude. Além disso, este objectivo permite-nos ir a locais que ainda não foram amostrados, pelo menos intensivamente, pelo que a nível de faunística também se esperam alguns resultados interessantes.

Como sou neste momento um dos membros da equipa mais a Sul, fiquei incumbido de tratar dos Cobra50 na Serra de São Mamede (e também de Monchique, embora isso mereça um post à parte). O resto da equipa era composto pela Ana Cristina Rufino, que já tinha participado no Cobra50 de Arzila, e pela Sandra, a nossa condutora. Saímos na sexta-feira dia 14 de minha casa, preparados para um fim-de-semana no campo. Viagem efectuada sem precalços através da A23 e IP2 até Portalegre, fomos directamente até ao ponto mais alto do Alentejo, na zona do Reguengo. Como teríamos de achar um plot de 1 hectare com estrato arbóreo e outro sem o dito estrato, a busca para encontrar locais interessantes foi deveras angustiante, já que no ponto mais alto da serra a paisagem é de certa forma desoladora, apesar das vistas de longo alcance. Isto porque naquela zona não há nenhuma floresta nativa, só plantações de Pinus pinaster (vulgo pinheiro-bravo) ou as sempre pestilentas acácias. Além disso, os locais que não tinham árvores eram também eles pouco aconselháveis para o nosso trabalho, já que eram espaços que tinham pinhal, mas que arderam faz algum tempo e estavam ainda em recuperação. Como procurávamos locais altos mas o mais nativos possível, não estavamos para ali virados e decidimos sair dali e começar a procurar locais mais baixos. Depois de dar umas voltas na zona do Reguengo, encontramos uma encosta de sobral mais ou menos abandonado, que escolhemos para o nosso plot arbóreo. O local tinha uma boa panóplia de arbustos nativos variados, uma boa manta morta, uns castanheiros, uns pinheiros, mas a árvore dominante era o sobreiro, e não nos pareceu que encontrássemos um local semelhante a uma altitude maior (estávamos nos 640m).
Depois disto, fomos procurar o nosso alojamento, para o Sul do parque natural, a apenas umas centenas de metros da fronteira com Espanha, na terra Hortas de Baixo, junto da aldeia de Esperança. Já tinha caído a noite entretanto, e foi uma aventura encontrar o local, já que nenhum de nós conhecia estas paragens e estávamos a progredir via estradinhas secundárias (em vez de termos ido para Arronches pela N246, que era mais directo). Depois de a Sandra manobrar o seu QB com mestria por estradinhas de terra batida com ervas altas até ao capô do carro, lá encontrámos a casa. Não houve tempo para muito mais além de descarregar o material e saudar as osgas que se alojavam nas paredes da casa.
No sábado, lá fomos de volta ao montado para efectuar o protocolo. A primeira tarefa foi delinear o hectare das recolhas directas com fita balizadora e de seguida cavar os 48 pitfall correspondentes às 12 amostras necessárias. O solo do montado era fofinho pelo que com 3 pessoas a cavar pitfall foi um instante. Pitfalls prontos e ainda havia uma hora para abobrar à sombra dos sobreiros enquanto se esperava pelo começo das recolhas directas. De notar para o encontro com a maior planta insectívora da Europa, Drosophyllum lusitanicum, que nenhum de nós conhecia até então senão através de fotos.

Chegadas as 16 da tarde, fomos efectuar as recolhas directas diurnas, que neste caso eram batimentos do estrato arbóreo e do estrato arbustivo. Não apareceu nada que fosse muito surpreendente nestas 4 amostras diurnas efectuadas.



Depois fomos procurar um tasco para jantar e recuperarmos alguma energia para as 4 horas de recolhas nocturnas que faltavam fazer. Achámos um na aldeia de Caia e regressámos ao plot para o ataque nocturno. Estas horas são sempre diferentes devido aos ruídos da noite que se ouvem aqui e acolá, e para além da ideia de encontrarmos algum javali furioso no plot e dos cães das aldeolas vizinhas que ladravam sem parar (seria por nossa causa, presumo...), tudo era paz. No final, o cansaço costuma ditar uma menor intensidade de movimentos, mas tudo correu bem. Pelas 2 da manhã estávamos prontos do plot e ainda tivemos que nos fazer à estrada para chegar ao tão merecido descanso nas Hortas de Baixo, pelo que só pelas 3 da manhã chegamos a casa.

Depois de nos levantarmos e recuperarmos energias com uma noite de sono e uma massa com atum caseira, lá nos dirigimos para a busca do nosso plot sem estrato arbóreo. Esta tarefa seria essencial para o desenrolar do resto do fim-de-semana já que teríamos que achar um local minimamente decente para as recolhas. Fomos em direcção a Marvão, outro ponto alto da Serra de São Mamede, mas também aí todos os montes estavam muito degradados por plantações de pinhal, campos agrícolas ou simplesmente estavam em recuperação depois de incêndio. À medida que o stress começava a acumular e nos dirigíamos para Marvão, decidimos ir ver as vistas da dita aldeia histórica.

A partir daqui, fomos na direcção da aldeia de Santo António das Areias, já que tinham-me sido fornecidas indicações pelo Parque Natural que apontavam para a existência de estepes relativamente nativas para esta área. Foi fácil dar com o local, mas não foi fácil decidir se seria ali que faríamos o protocolo, já que estávamos a uma altitude não muito elevada (545m). Depois de muito matutar, lá nos decidimos por aquele plot, já que o tempo começava a escassear e como já estavamos no final da tarde, passaríamos directamente às recolhas nocturnas, para que no dia seguinte pudéssemos regressar a casa ainda sob a luz do dia. A estepe tratava-se um terreno em solo granítico, repleto de arbustos variados, entre os quais uma Lavandula sp. que dava sempre um aroma agradável ao ar da estepe.As 4 horas de recolhas nocturnas passaram-se bem, e até se encontraram algumas coisas porreiras, não só dentro das aranhas como artrópodes em geral.
Mais uma vez, lá fomos pela última vez até Hortas de Baixo para passarmos a noite e rapidamente chegámos ao último dia de trabalho de campo. Só faltaria cavar os pitfall e efectuar as 2 horas de recolhas diurnas no mesmo local. Ao abandonar a casa onde estávamos uma foto nossa num camplo florido alentejano. A altura do ano indicada para se visitar o Alentejo é sem dúvida a Primavera, já que os campos estão floridos e coloridos com tons de roxo e amarelo e laranja. Passámos por muitos locais dignos de fotografia de postal. Os pitfall foram cavados com sucesso já que, apesar de a estepe ser bem rochosa, ainda se encontravam locais com a terra suficiente entre o granito. Findadas as recolhas, nota ainda para o Thomisus onustus mais cor-de-rosa que alguma vez vi! Fora das recolhas padronizadas, a Cristina encontrou também um dos Salticidae mais exuberantes de Portugal, um macho de Philaeus chrysops! E também para os sempre impressionantes Eusparassus dufouri, uma das maiores aranhas de Portugal. Depois de tudo feito, regressámos a casa, sendo que faltaria vir buscar os pitfall 15 dias depois. E lá fomos.








Todas as fotos neste post são ou da Ana Cristina Rufino ou da Sandra.

1 comentário:

  1. Boa tarde
    Sabia da existência das plantas insectivoras na serra de s. mamede, mas desconheço a sua localização´, como fotógrafo gostaria de fotografar essa planta, será que me podia indicar a localização das mesmas?


    José Macedo

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